A anarquia, ideal central do sistema político anárquico, tem como objetivo central o fim da autoridade estatal e do Estado em si. A etimologia da palavra remete ao grego e significa “ausência de governo”. Pode-se defini-la como uma filosofia política que repudia qualquer forma de hierarquia e dominação - inclusive a do Estado- e acredita que a partir da liberdade individual, da coletividade e da autogestão é possível alcançar uma sociedade ideal voltada para o bem comum.
É presente no senso comum o uso do termo anarquia para se referir a lugares ou momentos desordenados e caóticos, ou seja, atribuindo-se conotações negativas à ideia. É importante pontuar, entretanto, que como qualquer outra filosofia política, a anarquia possui suas origens históricas, usos e desdobramentos. Geralmente, os pensadores anarquistas não propõem cenários caóticos, mas pelo contrário, idealizam ordens sociais em que o Estado não é o órgão regulador.
A anarquia surgiu no século XIX e, assim como o comunismo e o socialismo, se propôs a construir uma forma alternativa de pensar o mundo em resposta ao crescente processo de expansão do capitalismo desde a Revolução Industrial.
Um dos primeiros autores a teorizar sobre a anarquia foi William Godwim que, na pretensão de pensar um sistema político alternativo ao capitalismo, propôs um modelo de sociedade em que não existiriam leis ditadas por um Estado. Para Godwin, a liberdade dos indivíduos associada ao fim das propriedades privadas, do sistema de classe sociais, do Estado e suas instituições daria margem à constituição de um estado sem dominação e sem opressão.
Em 1860, com a Associação Internacional dos Trabalhadores em Londres e as contribuições de Pierre-Joseph Proudhon, os ideais anarquistas adentraram no pensamento dos trabalhadores ingleses. A base filosófica anárquica recebeu a contribuição de muitos outros pensadores como Max Stirner e Leon Tolstoi. Seu desenvolvimento histórico levou à dissidências teóricas e práticas, e à sua expansão e associação com diversos outros movimentos políticos.
Pode-se afirmar que a anarquia é uma filosofia política que defende:
Em suma, podemos dizer que a anarquia rejeita qualquer forma de autoridade, inclusive as divinas, por acreditar que estas autoridades são as responsáveis pelas privações de liberdade e pela produção de opressões. Ao rejeitar o poder do Estado, não só por sua autoridade mas pelo seu papel na manutenção do sistema capitalista, o anarquismo espera propor uma nova lógica de ordem social.
A anarquia, entretanto, não é uma filosofia política homogênea e os caminhos para chegar a essa ordem social variam de acordo com correntes e divergências históricas. Existem, por exemplo, distinções entre os chamados anarquismo individualista e anarquismo coletivista.
Enquanto o primeiro defende que as liberdades e ações individuais devem ser mantidas ao extremo - a fim de evitar que formações coletivas acabem exercendo poder sobre os demais -, os anarquistas coletivistas acreditam que é o exercício desse individualismo exacerbado que pode levar um indivíduo a centralizar autoridade, de forma parecida com um Estado capitalista.
Além disso, os teóricos anarquistas diferiram quanto as formas de alcançar a ordem social anárquica. Enquanto autores como Proudon e Stirner defendiam uma mudança pacífica, Bakunin acreditava que só uma revolução violenta acabaria com a máquina do Estado.
São muitas as semelhanças entre a anarquia, o socialismo e o comunismo - ambos são anti-capitalistas, questionam as opressões e a propriedade privada - entretanto, a anarquia é a única que defende o fim absoluto do Estado.
O Anarcosindicalismo, também chamado de sindicalismo revolucionário, foi fundamental para as lutas pela emancipação da classe trabalhadora no século XX. Os anarcosindicalistas acreditavam que as organizações sindicais poderiam ser instrumentos de transformação social, atuando na destituição do Estado e do capitalismo e construindo uma sociedade democrática, autogerida pelos trabalhadores.
França, Itália e Espanha foram países que tiveram organizações sindicais anarquistas de grande força e atuação. Com o aumento da imigração europeia no século XX no Brasil, principalmente italiana, foi intensa a influência dos anarquistas no movimento operário no Brasil, exercendo papel fundamental na organização das greves da década de 1910.
O anarcofeminismo une ideais anarquistas e feministas e inclui a dominação de gênero como algo a ser também combatido politicamente. Ou seja, entende-se que a exploração da mulher no trabalho, a desvalorização de suas funções no âmbito doméstico e reprodutivo, as coerções morais e sexuais as quais as mulheres são submetidas e todos os tipos de violência que sofrem são resultados do processo de opressão capitalista. Por isso, para as anarcofeministas como Emma Goldman e Lucy Parsons, o fim das diferenças de gênero - que produzem sociedades onde os homens possuem mais vantagens, poder e valor - só poderia acontecer com o fim do capitalismo.
Veja você, meu amigo, te resta apenas um meio para não ser explorado, nem oprimido: demonstrar coragem. Se os trabalhadores que são tão numerosos se opuserem com todas as suas forças aos patrões e a quaisquer formas de governo, estaremos bem próximos dos homens verdadeiramente livres.
Fala da peça Uma comédia social, representada por operários de São Paulo nos anos de 1910. Adaptado de Nosso Século (1910-1930). São Paulo: Abril Cultural, 1981.
Durante a Primeira República (1889-1930), em cidades como o Rio de Janeiro e São Paulo, o movimento operário tornou-se um dos principais críticos às exclusões da sociedade brasileira. Considerando as propostas defendidas na fala citada do personagem, uma das ideologias que se fez presente no movimento operário brasileiro, naquele momento, foi: