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Função metalinguística

Português - Manual do Enem
Bianca Ferraz Publicado por Bianca Ferraz
 -  Última atualização: 28/7/2022

Introdução

Em uma de suas teorias desenvolvidas, o linguista Roman Jackobson afirmou que a linguagem é composta por diferentes funções da linguagem. Segundo essa teoria, cada um dos atos de linguagem pode ser dividido em seis componentes: o emissor, o receptor, a mensagem, o contexto, o canal e o código.

Cada um desses componentes se refere a uma determinada função da linguagem, de acordo com seus objetivos e características. Assim, ao focar em um desses componentes, um texto se aproxima mais da função da linguagem a qual esse componente se relaciona.

Não há nenhum impeditivo para que, em um mesmo texto, mais de uma função da linguagem apareça. Muito pelo contrário, o usual é que uma ou mais funções coexistam em uma mesma produção.

Nesses casos, para classificar um texto de acordo com a função da linguagem, é necessário, em primeiro lugar, identificar qual das funções presentes tem mais destaque, ou seja, qual delas é a função predominante.

Dentre as seis funções conceituadas por Jakobson, tem-se a função metalinguística, e sua principal característica é a preocupação com o próprio código dentro de uma determinada mensagem.

O código é aquilo por meio do que a mensagem pode ser transmitida. Por exemplo: uma poesia se vale do código verbal, ou seja, das palavras, para se constituir e ser transmitida. Seguindo esta ideia, uma poesia que fale sobre o fazer poético, sobre o trabalho do poeta para elaborar suas obras é, de forma predominante, metalinguística, pois traz uma reflexão sobre o próprio código de que se utiliza.

Índice

As características da função metalinguística

A principal característica da função metalinguística da linguagem é o foco no código, o qual é utilizado para explicar, analisar e refletir sobre o próprio código. Esse conceito tem grandes aplicações no dia a dia.

Um exemplo disso é quando, em uma situação de diálogo, deixamos de compreender algo que foi dito. Ao pedir uma explicação, é bastante provável que nos utilizemos de uma construção de caráter metalinguístico.

Além dessas situações cotidianas, a função metalinguística pode estar presente, também, em obras artísticas, não somente nas literárias – como em poesias – mas também em outros tipos, como quadros, filmes etc.

Veja, a seguir, um famoso poema de Carlos Drummond de Andrade, em que o autor modernista utiliza a função metalinguística:

“Procura da poesia

Não faças versos sobre acontecimentos.

Não há criação nem morte perante a poesia.

Diante dela, a vida é um sol estático,

não aquece nem ilumina.

As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.

Não faças poesia com o corpo,

esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.

Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro

são indiferentes.

Nem me reveles teus sentimentos,

que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.

O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.

O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.

Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.

O canto não é a natureza

nem os homens em sociedade.

Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.

A poesia (não tires poesia das coisas)

elide sujeito e objeto.

Não dramatizes, não invoques,

não indagues. Não percas tempo em mentir.

Não te aborreças.

Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,

vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família

desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.

Não recomponhas

tua sepultada e merencória infância.

Não osciles entre o espelho e a

memória em dissipação.

Que se dissipou, não era poesia.

Que se partiu, cristal não era.

Penetra surdamente no reino das palavras.

Lá estão os poemas que esperam ser escritos.

Estão paralisados, mas não há desespero,

há calma e frescura na superfície intata.

Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.

Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.

Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.

Espera que cada um se realize e consume

com seu poder de palavra

e seu poder de silêncio.

Não forces o poema a desprender-se do limbo.

Não colhas no chão o poema que se perdeu.

Não adules o poema. Aceita-o

como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada

no espaço.

Chega mais perto e contempla as palavras.

Cada uma

tem mil faces secretas sob a face neutra

e te pergunta, sem interesse pela resposta,

pobre ou terrível, que lhe deres:

Trouxeste a chave?

Repara:

ermas de melodia e conceito

elas se refugiaram na noite, as palavras.

Ainda úmidas e impregnadas de sono,

rolam num rio difícil e se transformam em desprezo”.

Perceba que, ao longo do poema, o eu lírico dá as instruções sobre como escrever uma poesia, revelando o árduo trabalho com a linguagem que é necessário até que a escrita se concretize. Isso mostra que o código está sendo utilizado para discutir o próprio código, o que caracteriza a função metalinguística.

Vale relembrar que a função metalinguística pode aparecer aliada à outra função da linguagem, como a poética, a exemplo do que ocorre no poema de Drummond citado anteriormente. Assim, vale reforçar que um mesmo texto pode apresentar diferentes funções da linguagem, mas haverá uma que é predominante.

Referências:

JAKOBSON, Roman. 1960. Lingüística e poética. In: _____ . Lingüística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 1991

Exercício de fixação
Passo 1 de 3
ENEM/2014

O exercício da crônica

Escrever crônica é uma arte ingrata. Eu digo prosa fiada, como faz um cronista; não a prosa de um ficcionista, na qual este é levado meio a tapas pelas personagens e situações que, azar dele, criou porque quis. Com um prosador do cotidiano, a coisa fia mais fino. Senta-se ele diante de uma máquina, olha através da janela e busca fundo em sua imaginação um assunto qualquer, de preferência colhido no noticiário matutino, ou da véspera, em que, com suas artimanhas peculiares, possa injetar um sangue novo. Se nada houver, restar-lhe o recurso de olhar em torno e esperar que, através de um processo associativo, surja-lhe de repente a crônica, provinda dos fatos e feitos de sua vida emocionalmente despertados pela concentração. Ou então, em última instância, recorrer ao assunto da falta de assunto, já bastante gasto, mas do qual, no ato de escrever, pode surgir o inesperado (MORAES, V. Para viver um grande amor: crônicas e poemas. São Paulo: Cia das Letras, 1991).

Predomina nesse texto a função da linguagem que se constitui

A nas diferenças entre o cronista e o ficcionista.
B nos elementos que servem de inspiração ao cronista.
C nos assuntos que podem ser tratados em uma crônica.
D no papel da vida do cronista no processo de escrita da crônica.
E nas dificuldades de se escrever uma crônica por meio de uma crônica.
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