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Estudantes de Medicina encontram no voluntariado forma de atuar no combate ao coronavírus

Estudantes de Medicina de universidades brasileiras contam como o trabalho voluntário é forma fundamental para que sigam atuando durante a pandemia de coronavírus

Aos 21 anos de idade, Gustavo Sakamoto não esperava estar empenhado tão cedo em um desafio tão grande para sua carreira. Estudante do 7º período de Medicina, ele é um dos alunos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) que se voluntariaram para trabalhar em hospitais no combate à pandemia do coronavírus.

Há quase um mês, Gustavo começou a atuar na Policlínica Piquet Carneiro, unidade de saúde da Uerj localizada na Zona Norte do Rio de Janeiro. Já enfrentando a mudança de rotina devido à quarentena, ele percebeu que o voluntariado era uma oportunidade para sair de casa e poder participar de uma forma ativa.

“Eu não aguentava mais ficar em casa. Além disso, como estudante de Medicina, eu tratei como uma obrigação de quem está na faculdade poder dar esse retorno para a sociedade. Acho que, para quem pode, é um dever nesse momento”, conta Gustavo.

A nova rotina fez bem para ele e os colegas não ficarem parados e seguirem praticando seus conhecimentos durante a formação. Na policlínica da Uerj, os alunos são responsáveis por dois tipos de atendimento. A triagem de pacientes que chegam ao hospital é o primeiro passo.

No procedimento, que dura cerca de 15 a 20 minutos, os estudantes avaliam o paciente e verificam se os sintomas apresentados podem indicar um resultado positivo para a Covid-19. Caso os sinais batam com a doença, a pessoa é encaminhada para realizar a coleta de material para ser examinado e testado se apresenta ou não o material genético do vírus.

(Foto: PPC/Uerj)
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Parte dos estudantes de Medicina da Uerj atuam na Policlínica Piquet Carneiro

Os estudantes, divididos nos turnos da manhã e da tarde, ainda passam orientações sobre o isolamento aos pacientes e como eles devem aguardar o resultado do exame afastados para evitar contágio.

Já em São Paulo, cidade que é o epicentro do coronavírus no Brasil e capital do estado que, até o dia 27 de abril, registra mais de 20 mil casos da Covid-19, estudantes também se mobilizaram para estar ativos frente ao combate do coronavírus.

No dia 14 de março, alunos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) receberam o comunicado que as aulas estariam suspensas a partir da segunda-feira (16). O fato deixou os alunos inquietos, principalmente os futuros profissionais da área da saúde. Na Escola Paulista de Medicina, uma das principais faculdades de saúde do país, estudantes perceberam que não poderiam ficar sem fazer nada durante a pandemia.

Sem aulas, não demorou para que as turmas se organizassem para ajudar no combate ao coronavírus. Logo na primeira semana com salas de aula vazias, as turmas de 5º e 6º ano se reuniram com a coordenação do curso e organizaram um grupo que, inicialmente, tinha cerca de 120 voluntários.

“A gente não queria parar”, afirma Natália Borges Cardin, aluna do último ano de Medicina na Unifesp. “É como se quiséssemos usar o nosso conhecimento de estudantes dos últimos anos para ajudar a população.”

A estudante é uma das responsáveis pelo projeto, que tem diversas áreas de atuação direta com a comunidade. Uma das funções é acompanhar a evolução de pacientes que foram atendidos na Unidade de Infecção Respiratória do pronto-socorro do Hospital São Paulo, da Unifesp.

Nesse atendimento feito por telefone, os alunos avaliam o quadro dos pacientes e dão orientações sobre os cuidados. “Eles ficam muito felizes de receber a ligação e toda essa atenção. Há casos que o atendimento dura 10 minutos e o paciente fica mais de 20 minutos conversando sobre como estão bem e se recuperando. E isso deixa a gente muito contente”, conta Natália.

Ela relata outras ações que têm participação de alunos, como campanhas de doação para os hospitais e população, triagem de pacientes nas unidades e campanhas de vacinação. As campanhas são voltadas para comunidades de São Paulo e já tiveram atendimento para profissionais da saúde e policiais militares.

(Foto: Arquivo pessoal/Natália Cardin)
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Uma das ações dos voluntários da Unifesp é a vacinação em comunidades de SP

Fora da capital, faculdades no interior de São Paulo também estão atuando frente ao coronavírus. Campinas, uma das maiores cidades do estado e que já tem mais de 260 casos confirmados, conta com dois hospitais universitários que recebem atendimento: o Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o Hospital da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).

Na PUC-Campinas, quando alunos dos primeiros anos tiveram aulas canceladas pelo Ministério da Saúde, estudantes que estavam no internato (estágio obrigatório para alunos da saúde nos últimos anos do curso) seguiram atuando no hospital. Mas, com a piora dos casos durante as semanas seguintes, o Ministério também cancelou o estágio.

Assim, os estudantes nessa fase do curso também passaram a realizar o teleatendimento. Foi o caso de Lucas Lopes, aluno do 9º período de Medicina na PUCC. “Durante semanas ficamos ligando para pacientes e fazíamos uma consulta sem o exame físico, sem poder ver o paciente”, relatou. “É a melhor saída pra continuar ajudando as pessoas que necessitam do serviço do SUS (Sistema Único de Saúde).”

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A organização de estudantes com as universidades

O novo coronavírus pegou todo o mundo de surpresa. Como a última pandemia aconteceu há mais de 100 anos, a sociedade não estava preparada para enfrentar a escalada global do vírus.

Nem mesmo as faculdades de Medicina poderiam se planejar para compreender a situação. “Quando isso chegou, precisamos entender a pandemia melhor e como poderíamos ajudar nossos alunos”, lembrou Aécio Góis, professor e coordenador do curso de Medicina na Unifesp.

Os estudantes marcaram uma reunião imediatamente para apresentar a proposta de atuar como voluntários, logo aceita pela coordenação. “Rapidamente providenciamos equipamentos de segurança suficiente para os alunos, porque foi algo intuitivo. Depois vimos recomendações internacionais de que o voluntariado seria a melhor alternativa de ensino e de formação para os alunos de Medicina durante a pandemia”, conta Aécio.

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O doutor percebe o empenho dos estudantes e valoriza toda a dedicação que eles apresentam em um momento tão delicado e importante para a saúde mundial.

“Eles vêm mostrando profissionalismo, altruísmo e resiliência, e nós temos vivido uma troca extremamente rica com nossos alunos”, elogia o coordenador. “É algo que a pandemia veio com muita dor, mas veio para mudar o olhar da verdade da educação, que os alunos têm potencial muito maior do que todos imaginam.”

“Agora estamos com quase 20 projetos e 240 alunos da Unifesp como voluntários, com pessoas do 1º ao 4º ano também participando”, conta Natália Cardin. Além da participação dos estudantes, da coordenação e de professores, ela destaca que ex-alunos também exercem papel fundamental para ajudar.

“Desde que entrei na faculdade, é uma turma muito unida”, afirma a aluna. “Os profissionais que estavam se formando quando eu estava no primeiro ano trabalham em hospitais há algum tempo, têm toda a rotina corrida e, mesmo assim, tiram um tempo para estarem com os estudantes nesse momento”, ela completa.

Na Uerj, os estudantes passam por preparação com cursos de capacitação em diversos procedimentos. As aulas acontecem semanalmente e são parte de toda a estrutura que a universidade oferece aos alunos para que possam ter uma experiência positiva na formação.

“A estrutura facilita ser algo construtivo para o estudante, já aprendi bastante e é uma experiência única”, conta Gustavo Sakamoto, que ainda tem metade do curso pela frente. “Os alunos têm o apoio total da Uerj e do hospital, questão de segurança e equipamentos necessários, uma estrutura que dificilmente você vê em qualquer hospital, tudo fornecido pela instituição.”

“E a principal atenção dos nossos professores é sempre o cuidado com os estudantes. O tempo todo eles observam o trabalho para garantir se está todo mundo bem”, completa o estudante.

A pandemia traz novos olhares para a saúde pública

Quando ingressou na Uerj, não estava nos planos de Gustavo Sakamoto seguir a profissão dentro do sistema de saúde pública brasileiro. Seu interesse era maior pelo setor privado.

Buscar a carreira na área pública não é um objetivo comum nos dias de hoje para a maioria dos estudantes da saúde. “A gente passava por um momento de desvalorização do SUS, em que as pessoas eram condicionadas a não achar que o SUS é a melhor alternativa,” conta Aécio Góis, coordenador da Unifesp.

Para o professor, esse é um dos paradigmas que a pandemia já começa a mudar. “O estudante de Medicina vai poder ter acesso e entender a importância do SUS e de um sistema de saúde bom no meio de uma pandemia. Viram que o SUS é fundamental e precisa ser bem equipado, com boas condições para bons profissionais”, afirma o médico. “Assim, teremos estudantes que almejam atuar no SUS”.

Essa mudança de olhares em relação à saúde pública já tocou Gustavo e seus colegas na Uerj. “Depois que vimos a importância de um sistema público de saúde bom e como a gente pode ajudar, mudamos o nosso ponto de vista e cresceu o meu interesse em relação à gestão pública”, relata o estudante.

“A gente vê que o grande problema hoje é a gestão de recursos nos hospitais. Se preparar para algo assim é fundamental, nenhum país do mundo estava pronto para isso. Então surge um interesse nessa área”, ele conta.

Aluna de Aécio na Unifesp, Natália Cardin também valoriza o SUS e comenta a importância da saúde e educação pública nesse momento.

“As universidades públicas têm um grande número de pesquisas científicas que ajudam muito durante uma situação de pandemia como essa. Então todo o conhecimento científico, que também faz parte do investimento no SUS, volta para a sociedade e tudo sem custos para a população”, diz Natália.

“Uma coisa que a pandemia vai deixar de recado no Brasil é a questão da importância do SUS. O que vai fazer diferença nessa pandemia não é o sistema privado, é o sistema público, em qualquer lugar do mundo”, afirma Gustavo.

“Saúde é algo coletivo”, ele completa. “Em uma pandemia não adianta você ter o melhor plano privado de saúde, você estará exposto aos riscos.”

(Foto: Unifesp/Reprodução)
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Hospital São Paulo, da Unifesp, integra e recebe pacientes pelo SUS

Uma nova geração de estudantes, médicos e do ensino da Medicina

Todo esse movimento de voluntariado empolga Aécio, que começou a sua profissão no momento em que surgia o SUS. “Para mim, que sou de uma geração que entra na faculdade quando o SUS foi criado, é indescritível ver alunos valorizando o sistema”, conta.

Para o coordenador da Unifesp, os novos paradigmas vão trazer mudanças na forma de ensinar a Medicina, e novos alunos vão perceber como a profissão exige pessoas dedicadas à outras pessoas. “O cuidar vai ser diferente, o educar vai ser diferente. Tudo isso que está sendo aprendido e o conhecimento adquirido durante essa pandemia vai fazer com que mudem o olhar das bases curriculares, que as mudanças no ensino sejam bem marcantes”, aponta Aécio.

O professor ainda fala que, no meio de toda a pandemia, é possível tirar algo positivo para o futuro da Medicina e, consequentemente, da sociedade.

“É muito bom ver quantas pessoas boas e bem formadas e profissionais dedicados estão vindo para o mercado, e como a gente fica feliz que os nossos alunos, que se espelham em nós e a gente se espelha neles, estão vindo com tanta qualidade para a profissão.”

“Ver o tanto de alunos dedicados ao voluntariado é algo esperançoso. A gente passa por isso com a esperança de sair com um futuro melhor”, conclui Aécio.

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