Você já ouviu a palavra “nonada”? E a palavra “ensimesmudo”? Se nunca ouviu, pode ficar calmo. Esses são neologismos, ou seja, palavras inventadas pelo autor Guimarães Rosa!
Você já ouviu a palavra “nonada”? E a palavra “ensimesmudo”? Se nunca ouviu, pode ficar calmo. Esses são neologismos, ou seja, palavras inventadas pelo autor Guimarães Rosa!
Guimarães Rosa foi um escritor mineiro da terceira fase do modernismo brasileiro. Além disso, também foi diplomata e médico.
Sabia mais de 24 idiomas, entre eles, francês, alemão, holandês, inglês, espanhol, italiano, esperanto, russo, latim e grego.
Guimarães Rosa é um grande exemplo de autor que soube usar, ao mesmo tempo, as três vertentes citadas da terceira fase do modernismo: a análise psicológica das personagens, o realismo mágico – em que acontecimentos surreais ocorrem em um mundo normal –, e o regionalismo, em que o interior do país é retratado.
Por ser do interior de Minas Gerais, Guimarães Rosa soube como trazer o sertão mineiro para a literatura. Ele transcreveu com perfeição a coloquialidade com que vaqueiros, jagunços e sertanejos conversavam. Vaquejadas, ciganos e onças são temas recorrentes em sua obra.
“De primeiro, eu fazia e mexia, e pensar não pensava. Não possuía os prazos. Vivi puxando difícil de difícil, peixe vivo no moquém: quem mói no asp'ro não fantasêia. Mas, agora, feita a folga que me vem, e sem pequenos dessossegos, estou de range rede. E me inventei nesse gosto de especular idéia. O diabo existe e não existe. Dou o dito. Abrenúncio. Essas melancolias. O senhor vê: existe cachoeira; e pois? Mas cachoeira é barranco de chão, e água caindo por ele, retombando; o senhor consome essa água, ou desfaz o barranco, sobra cachoeira alguma? Viver é negócio muito perigoso…”
Para o autor, o sertão era mais do que uma localidade no interior do Brasil. O sertão, para ele, era universal e estava dentro de cada ser humano.
Para ele, o importante era falar sobre os problemas internos do ser humano e também sobre a metafísica da vida: há sentido na existência? O Bem e o Mal existem? Há um Deus? A obra “Grande Sertão: Veredas” enfatiza a presença do Diabo.
O autor ficou conhecido por criar novas palavras, os famosos neologismos. Seu estilo era altamente estilizado e poético. Diplomata, ele chegou a estudar 24 idiomas e soube usar desse conhecimento na hora de criar e utilizar palavras já conhecidas. Ele misturava diversos idiomas e enfatizava a importância da língua portuguesa, principalmente a linguagem do cotidiano.
“O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem”
Sua primeira obra publicada foi “Magma”, em 1939. Em 1946, ele lança “Sagarana”, importante livro de contos que mostra perfeitamente seu estilo. Nele, o leitor encontra o famoso conto “A hora e a vez de Augusto Matraga”.
Em 1956, Guimarães Rosa publica sua obra-prima: o romance “Grande Sertão: Veredas”. Nele, o autor conta a história de Riobaldo, um jagunço que acaba se apaixonando pelo colega Diadorim. Não queremos dar spoilers, mas há um pacto com demônio no meio do enredo.
“O senhor... Mire veja: o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior.”
Guimarães Rosa possui um dos estilos mais únicos da literatura brasileira. Ele soube escrever poeticamente e usar a linguagem da melhor forma possível, manejando-a conforme queria.
Todavia, ele não se prendeu em uma torre de marfim: sempre deu foco aos problemas sociais pelos quais o povo do campo, principalmente do sertão, passa todos os
dias. Ele foi politicamente engajado e construiu obras que mostram com fidelidade o que é ser mineiro, o que é ser um morador do interior do país.
Famigerado
“Com arranco, [o sertanejo] calou-se. Como arrependido de ter começado assim, de evidente. Contra que aí estava com o fígado em más margens; pensava, pensava. Cabismeditado. Do que, se resolveu. Levantou as feições. Se é que se riu: aquela crueldade de dentes. Encarar, não me encarava, só se fito à meia esguelha. Latejava-lhe um orgulho indeciso. Redigiu seu monologar.
O que frouxo falava: de outras, diversas pessoas e coisas, da Serra, do São Ão, travados assuntos, insequentes, como dificultação. A conversa era para teias de aranha. Eu tinha de entender-lhe as mínimas entonações, seguir seus propósitos e silêncios. Assim no fechar-se com o jogo, sonso, no me iludir, ele enigmava. E, pá:
— Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: fasmisgerado… faz-me-gerado… falmisgeraldo… familhas-gerado…?”
ROSA, J. G. Primeiras estórias. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988
A linguagem peculiar é um dos aspectos que conferem a Guimarães Rosa um lugar de destaque na literatura brasileira. No fragmento lido, a tensão entre a personagem e o narrador se estabelece porque