26 universidades particulares estão entre as cem melhores em pesquisas no Brasil
Instituições privadas também usam recursos públicos para o trabalho das pesquisas, que podem ser afetados com recentes suspensões.
As universidades particulares são minoria na lista por qualidade de pesquisa do Ranking Universitário Folha (RUF) 2018, da Folha de S.Paulo. Entre as cem primeiras, apenas 26 instituições são privadas. A única dentro do top 20 é a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), na 19ª colocação.
Em 22º, está a PUC Rio. Após as duas, uma universidade particular só volta a aparecer na 44ª posição: PUCPR. Dentro das 50 primeiras, ainda estão a Universidade Católica de Brasília (UCB), em 46º, e a Universidade Católica de Pelotas (UCPEL), em 49º.
As últimas semanas foram movimentadas para o campo das pesquisas científicas no Brasil. Em maio, as universidades receberam um ofício da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) que informou a suspensão de novas bolsas para pesquisas.
Antes disso, no final do mês de abril, o MEC anuncio o bloqueio de 30% dos recursos das universidades públicas federais. Essas instituições são responsáveis por boa parte das principais pesquisas científicas que acontecem no país. Mais da metade das universidades no top 100 do RUF de Pesquisa são federais.
As estaduais também sofrem com o corte de novas bolsas pelo Capes. Elas lideram oito dos nove indicadores do ranking de pesquisa da Folha. A Universidade de São Paulo (USP), primeira do geral, encabeça cinco deles: total de publicações e citações, citações por docente, publicações em revistas nacionais e recursos captados.
Outros três indicadores são liderados pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). 78ª no RUF, a Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul) é a única particular a liderar algum dos itens avaliados. É a instituição brasileira com mais citações por artigo publicado.
PUCRS trabalha com estudos em diversas áreas
Líder entre as particulares, a PUCRS desenvolve pesquisas em múltiplas áreas. Recentemente, publicou um estudo inédito sobre a origem da composição de hidratos de gases na Foz do Rio Amazonas.
“Somos os pioneiros a abordar este assunto no meio científico internacional na área. Basicamente, a origem deste gás provém de microrganismos que decompõem a matéria orgânica”, explica Luiz Frederico Rodrigues, pesquisador do Instituto do Petróleo e dos Recursos Naturais da universidade.
Durante o período da Páscoa de 2018, o Instituto Nacional de Ciências Forense da PUCRS realizou uma pesquisa junto à Polícia Federal que mostrou irregularidades na venda de bacalhau. O estudo apontou que sete em cada dez peixes comercializados em mercados da região de Porto Alegre eram vendidos como bacalhau, mas na verdade eram espécies mais baratas.
A universidade ainda tem equipes de pesquisa em áreas como a Saúde, Educação, Tecnologia da Informação e Sociedade e Desenvolvimento.
Pesquisas em instituições privadas também podem ser afetadas
As universidades particulares que se destacam no cenário nacional de pesquisas também sustentam seus trabalhos utilizando recursos públicos.
A primeira instituição privada do estado de São Paulo a aparecer no RUF de Pesquisa é a Universidade do Vale do Paraíba (Univap). 57ª no geral e sexta entre as particulares, ela tem participação importante no cenário das pesquisas no Brasil, com programas de pesquisa credenciados pela Capes desde 1998.
“Quando a universidade foi criada, em 1992, uma preocupação era como ia se dar o desenvolvimento da pesquisa”, conta a doutora Sandra Costa. “A opção que nós tivemos foi maximizar os investimentos, minimizar custos e otimizar a utilização dos recursos. Então nós criamos, naquele momento, o Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IP&D)“, completa a professora, que é pró-reitora de Pesquisa da Univap.
Por estatuto, o IP&D concentra as pesquisas e os cursos de pós-graduação stricto sensu da Univap. No momento, há cinco programas em funcionamento: Engenharia Biomédica, Planejamento Urbano e Regional, Física e Astronomia, Processamento de Materiais e Bioengenharia.
Para manter a estrutura atendendo a demanda de pesquisadores, professores e alunos, todos programas possuem um aporte da Capes, além de recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Conselho de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
O movimento atual de cortes e suspensão de bolsas e verbas para pesquisas preocupa as instituições. “Os programas acadêmicos rodam muito bem porque temos o apoio da Capes”, afirma Sandra, que define esse suporte como fundamental.
“O Brasil é um país que precisa da pesquisa, para ele poder realmente se reinventar e sair dessa condição de subdesenvolvimento. Sem isso, a gente não avança nem economicamente, nem socialmente”, completa a doutora.
Cortes nas federais pode concentrar pesquisa nas regiões Sul e Sudeste
O top 100 do RUF de Pesquisa possui 34 universidades públicas fora da região Sul e Sudeste. Entre as particulares, depois da UCB (46ª colocada), outra instituição além do eixo Sul-Sudeste só volta a aparecer na 88ª posição: Universidade Tiradentes (Unit). Apenas mais uma aparece entre as cem primeiras do ranking. Em 98º lugar, está a Universidade de Fortaleza (Unifor).
Afetada com os cortes do Capes, a Universidade Federal do Ceará (UFC), primeira fora do eixo a aparecer no RUF, na 10ª posição, é outra que começa a apresentar dificuldades para a pesquisa.
“Essa descontinuidade afeta muito os projetos de pesquisa, a formação de mestres e doutores e, praticamente, faz com que a gente perca recursos públicos que já haviam sido investidos nos projetos”, diz o pró-reitor adjunto de Pesquisa e Pós-Graduação da UFC, Jorge Herbert Soares de Lira.
Em um esforço que vem desde a década de 90, a UFC conseguiu atingir níveis de excelência internacional em pesquisa. A instituição iria participar de programas de “internacionalização” de pesquisa e começou a se organizar para receber parceiros internacionais e a enviar estudantes para fora do Brasil. Mas logo a falta de recursos começou a dificultar.
“Isso tudo fica comprometido e o dinheiro que já foi investido se perde na finalidade inicial”, afirma o professor. “Em termos práticos, não tem como você sustentar um estado que é particularmente pobre em pesquisas de ponta com alunos que estão extremamente fragilizados no ponto de vista econômico”, completa.
Em seu grupo de pesquisa, no campo da Matemática, o doutor possui projetos para reverter o quadro de educação básica do estado do Ceará. Mas, sem recursos suficientes, os trabalhos concentrado nisso também perdem o foco. Esse tipo de exemplo mostra como a falta de estímulo à educação de nível superior afeta diretamente a educação básica.
“A Matemática é um dos principais gargalos para o desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Igualmente, se a gente tem interrupção de financiamento, todo o esforço que vinha sendo feito na direção de melhorar a educação básica acaba também se perdendo”, conclui o doutor.