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José Pacheco e Pedro Demo: por uma escola focada no aluno

Os dois educadores falam sobre a importância em criar ambientes que incentivem os alunos a serem autores do próprio conhecimento.

Vivemos em um mundo tecnológico em que tudo acontece instantaneamente, com apenas um clique – ou “touch”. Dispositivos inteligentes, carros que dirigem sozinhos, a Internet das Coisas, são apenas algumas características da indústria 4.0. O desenho dos Jetsons, que há décadas parecia algo distante, está mais presente do que nunca. No meio de toda esta mudança, a escola, porém, parece ter ficado parada no século XIX. 

Menina segurando uma lupa.


Currículos engessados, alunos sentados e enfileirados em frente a uma lousa, escutando o professor falar. Este formato de sala de aula, criado durante a Revolução Industrial, continua sendo o mais encontrado nas escolas brasileiras e, segundo especialistas da área, precisa mudar. 

“A lógica da escola parte do pressuposto de um consumidor, ela gera consumidor e produz consumo, essa é a lógica da escola da Revolução Industrial; ela foi criada para isso: para fábrica, para o condicionamento, para a peça que está estragada jogar fora. Essa lógica não serve mais, o ensino está conectado a isso”, afirma Cláudia Passos, Diretora da Ecohabitare, empresa que fornece consultoria e projetos educacionais. 

Ensinagem vs. aprendizagem

Para José Pacheco, educador e idealizador da Escola da Ponte – instituição da rede pública de ensino localizada próximo ao distrito de Porto, em Portugal, e que se tornou referência mundial pelo seu modelo de educação baseado na autonomia dos alunos –  os sistemas de ensino precisam ser substituídos por sistemas de aprendizagem.

Mas, qual a diferença?

Pacheco explica que a maioria das escolas de hoje em dia são baseadas no instrucionismo, ou seja, em um modelo que tem o professor como protagonista, transmitindo conteúdo para os estudantes. Os sistemas de aprendizagem, por sua vez, veem o aluno como criador do próprio conhecimento e o professor como mentor, mediador deste processo. 

De acordo com o pedagogo “a aprendizagem só acontece quando ela é significativa; quando o aprendiz sabe porquê é que procura, porquê é que se informa, porquê é que produz conhecimento”. 

Em outras palavras, a aprendizagem acontece de dentro para fora, e não o contrário. O professor complementa dizendo que não é necessário uma sala de aula para promover o aprendizado, pois este acontece em qualquer lugar: na escola, em casa, em um parque ou em um museu.

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Baseado neste conceito é que surgiu a Escola da Ponte, em 1976. Uma instituição diferenciada que não possui salas de aula, turmas e provas. Na Ponte, os professores não são responsáveis por uma disciplina ou por uma série específica e os alunos são os responsáveis por definir as suas áreas de interesse e desenvolvem diversos projetos de pesquisa. 

José Pacheco ressalta que a diferença da Escola da Ponte para uma escola “tradicional” é que a primeira baseia-se em projetos de vida, “aprende-se a fazer, aprende-se a ser e aprende-se a conviver.” O educador explica esta lógica através de um exemplo real do Projeto Âncora – escola brasileira que segue a mesma filosofia portuguesa.

“Eu estava no Projeto Âncora e uma menina chegou de outra escola, não queria fazer nada. E eu perguntei para ela: o que queres ser? E ela disse: eu quero ser rapper. Fizemos um projeto de vida para ela ser rapper, ela aprendeu tudo em quatro meses o que ela não sabia antes, ela tinha nove anos. Quatro anos depois, aos 13 anos, ela participou na abertura dos Jogos Olímpicos do Brasil e hoje é uma das maiores rappers do Brasil: MC Soffia”, conta.

Como implementar o sistema de aprendizagem nas escolas

O educador português não é o único que compartilha da ideia de que a aprendizagem só é possível quando ela acontece de maneira autoral. Pedro Demo, PhD em Sociologia pela Universidade de Saarbrücken, Alemanha, também ressalta a importância em adotar uma escola que tenha o aluno como foco e criador do próprio conhecimento.

“O que é que está faltando na escola? São as atividades de aprendizagem. O que tem lá é atividade de ensino: tem aula, prova, repasse de montão e o no fim do ano a gente vê que ninguém aprendeu nada”, afirma. 

Segundo Demo, os dados divulgados pelo Ideb, Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, em 2015, são apenas um reflexo de que o modelo instrucionista adotado pelas escolas não funciona. Na tabela abaixo, por exemplo, observa-se que de 1995 a 2015, a maioria dos estados brasileiros sofreu uma queda no percentual de aprendizado considerado adequado na disciplina de português.

Proficiência dos brasileiros na língua portuguesa segundo o Ideb.

Contudo, fazer essa transição para um modelo que incentive o aluno a exercitar o pensamento crítico e não apenas a copiar e decorar o conteúdo transmitido, não é uma tarefa tão simples. Para que isso aconteça, é preciso primeiro capacitar os educadores. “A formação do professor é ruim, então ele se transforma em um profissional da aprendizagem, em um profissional do ensino. A Finlândia, por exemplo, exige mestrado do professor da pré-escola”, explica o sociólogo. 

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Coronavírus e educação: usando a pandemia como oportunidade para a transformação

Desde o final de março, centenas de milhares de escolas ao redor do mundo tiveram que adaptar os seus modelos de ensino para o on-line. Muitas foram confrontadas com essa realidade pela primeira vez. 

Tanto José Pacheco, como Cláudia Passos e Pedro Demo acreditam que a pandemia é uma ótima oportunidade para refletir sobre a forma como a educação tem sido praticada no Brasil e realizar mudanças, entretanto, o que se tem visto é exatamente o contrário.

“Não adianta pegar o sistema instrucionista, pegar essa aula para ser copiada e colocar em um vídeo, é a mesma miséria, é o que estamos fazendo em grande estilo. Os sistemas estão querendo transportar esses conteúdos físicos ou em papel, para vídeo”, afirma Demo. 

De acordo com os especialistas, o on-line não é uma nova aprendizagem, e sim apenas mais uma ferramenta para promover o conhecimento. Cada vez mais, a inteligência artificial e os robôs são incluídos nos sistemas de educação ao redor do mundo.  

Dessa forma, o ensino híbrido – modelo que mescla aulas físicas com aulas on-line – será ainda mais utilizado. Portanto, cabe às escolas e aos professores utilizar as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) de maneira segura, criativa e eficiente, sem repetir os vícios da velha aula. 

Iniciativas como o Wikipédia, blogs, webinários e as redes sociais, são ótimas ferramentas para promover ambientes digitais que peçam a autoria e participação dos estudantes, através da produção de vídeos, áudio e textos multimodais

Seja on-line ou off-line, os alunos devem ser incentivados a pesquisar, procurar, indagar, experimentar, estabelecer relações e produzir conhecimento, só assim, segundo Pacheco, eles terão realmente aprendido.

“Ensinar é impossível porque ninguém dá de beber a um cavalo quando ele não tem sede”. – José Pacheco

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