Medicina no exterior: como conseguir uma vaga em uma universidade estrangeira?
Ao contrário do que muitos pensam, estudar em uma instituição de ensino estrangeira pode ser bem mais acessível ou até mesmo custar o equivalente do que estudar em uma universidade brasileira
Em nota divulgada no fim de 2018, o Conselho Federal de Medicina (CFM) afirmou que o Brasil já possui o número suficiente de médicos formados para atender a demanda da população.
Entretanto, a busca por essa graduação não para de crescer. De acordo com os dados mais recentes do Censo da Educação Superior, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), em 2017, o País possuía mais de 135 mil estudantes de matriculados no curso de Medicina, um aumento de cerca de 10% em comparação com o ano anterior.
Com a disputa acirrada pelas vagas disponíveis e o alto valor das mensalidades, muitos brasileiros buscam uma oportunidade fora do Brasil para conseguir realizar o sonho de ser médico algum dia.
E, ao contrário do que muitos pensam, estudar em uma instituição de ensino estrangeira pode ser bem mais acessível (considerando a forma de ingresso e a questão financeira) ou até mesmo custar o equivalente do que em uma universidade brasileira, mas com o benefício de realizar um intercâmbio durante a graduação.
Medicina na terra dos hermanos
A América Latina é o destino mais escolhidos pelos brasileiro para estudar Medicina. Isso ocorre devido à proximidade com o Brasil e à viabilidade nas mensalidades. Na parte sul do continente, os países mais desejados são: Argentina, Paraguai, Colômbia, Bolívia e Cuba.
Vitória Resende Ferreira, 18 anos, está do terceiro semestre de Medicina na Universidad Sudamericana, localizada em Pedro Juan Caballero, no Paraguai, e conta que preferiu a oportunidade de estudar no país vizinho do que realizar mais um ano de curso pré-vestibular.
“Eu decidi estudar fora no fim do terceiro ano do Ensino Médio, quando prestei vestibular e não passei no curso que eu tanto queria. A minha outra opção era fazer cursinho, mas eu vejo muita gente que passa anos estudando e ainda assim não consegue ingressar na faculdade, é muito desgastante e muita pressão. Então, optei por estudar no exterior já que era mais acessível”, conta a Vitória.
Para o ingresso na Sudamericana não foi preciso fazer o vestibular, apenas realizar a matrícula, o que já elimina o desgaste do processo seletivo. Além disso, há o benefício do valor relativamente baixo, em comparação às mensalidades em universidades brasileiras: “Como a minha faculdade fica no Paraguai, o valor nunca é fixo, já que ficamos dependentes do câmbio, mas, atualmente, pago em torno de R$ 1000”.
Millena Lopes também é estudante de Medicina e decidiu estudar no Paraguai, mais precisamente na Universidad Privada del Este (UPE), e também encontrou um processo seletivo menos concorrido que o brasileiro. “O ingresso nessa universidade no Paraguai é bem diferente do que no Brasil, mas é muito parecido com o sistema da Argentina, em que você faz alguns meses de curso para nivelação. Depois das aulas e das provas, se você for aprovado, ingressa no curso. Eu achei esses exames tranquilos e não conheci ninguém que tenha reprovado neles no ano em que eu tentei”, relembra.
E, assim como no caso de Vitória, o valor da mensalidade também foi um grande atrativo. Quando ingressou na UPE, Millena pagava em torno de R$ 800 por mês, algo que, em comparação ao Brasil, é um preço bem abaixo do mercado, sendo que a promessa de reajuste permanece entre os 10% e 20% ao ano. Ainda com a correção do valor, até o fim dos seis anos, a economia final ainda compensa.
Além disso, há também a oportunidade de ingressar em universidades públicas, que, assim como no Brasil, não cobram mensalidade. Rafaela Valéria Pereira, 26 anos, está no último ano da Universidade de Buenos Aires (UBA), na Argentina, e, além dos custos para viver em outro país, não desembolsou nenhum peso argentino para estudar em uma das melhores universidades do país.
Quais são as universidades da América do Sul com mais brasileiros?
No fim de 2018, um relatório elaborado pelo Ministério das Relações Exteriores relatou quantos estudantes nos cursos de Medicina de faculdades da Bolívia, Argentina e Paraguai eram brasileiros. Veja a tabela:
BRASILEIROS NOS CURSOS DE MEDICINA DA AMÉRICA DO SUL |
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País | Nome da Universidade | Número de Brasileiros |
Bolívia | Universidad Amazónica de Pando | 601 |
Bolívia | Universidad Técnica Privada | 707 |
Bolívia | Universidad de Aquino | 140 |
Bolívia | Universidade Central | 360 |
Bolívia | Universidade Del Valle | 353 |
Bolívia | Universidade Privada Aberta Latinoamericana | 1470 |
Bolívia | Universidade Privada Franz Tamayo | 800 |
Bolívia | Universidad Mayor de San Simón | 8 |
Bolívia | Universidade Técnica Privada Cosmos | 200 |
Argentina | Universidade Nacional de Rosário | 2400 |
Argentina | Universidade Nacional de La Plata | 1500 |
Argentina | Universidade de Buenos Aires | 1800 |
Argentina | Fundação de Barceló | 2000 |
Argentina | Universidad Abierta Inteamericana | 500 |
Argentina | Alunos distribuídos em cinco universidades localizadas em Buenos Aires | 400 |
Argentina | Faculdade de Medicina La Rioja | 326 |
Argentina | Universidad Nacional de La Rioja | 350 |
Paraguai | Universidade Internacional Tres Fronteiras | 4000 |
Paraguai | Universidade do Norte | 860 |
Paraguai | Universidad Del Pacifico | 1100 |
Paraguai | Universidade Sudamericana | 744 |
Parceria Brasil/Angola
Para aqueles que desejam ir um pouco mais longe, há a possibilidade de estudar em Angola por intermédio de uma faculdade brasileira!
Com a primeira turma para ser formada em 2019, a Faculdade de Agudos (Faag), localizada no interior do estado de São Paulo, realizou uma parceria com a Universidade Privada de Angola (Upra) para que estudantes brasileiros tivessem a oportunidade de realizar o curso de Medicina no continente africano.
“O curso de Medicina da Upra existe desde 2002 e tem seis anos de duração. A partir do terceiro ano, o aluno inicia os estágios em hospitais, clínicas e centros médicos. A grade contempla todas as áreas da Medicina, para além da Infectologia e Medicina Tropical”, explica Márcia Regina Vazzoler, representante da Faag.
Além do curso de seis anos, essa parceria também oferece, a partir do terceiro ano, um curso semipresencial para preparar os alunos para o Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituições de Educação Superior Estrangeira (Revalida), uma prova para revalidação dos diplomas de estrangeiros e brasileiros que se graduaram em outro país e querem exercer a profissão no Brasil.
“Paralelo à formação no curso de medicina da Upra, a Faag faz uma formação específica, de 1.200 horas, para o Revalida. Essa formação inicia no terceiro ano e é semipresencial. Além disso, para auxiliar o aluno, são aplicados testes para descobrirmos em quais áreas da Medicina que precisam ser mais trabalhadas pelos estudantes”, ressalta Márcia.
Nessa parceria, o aluno trata diretamente com o faculdade brasileira para lidar com qualquer problema ou burocracia durante a graduação como, por exemplo, matrícula, visto de estudante, recepção em Angola, manutenção de moradia e transporte. Aliás, esse é um dos diferenciais do acordo feito entre as duas instituições, no valor da mensalidade também está incluso custos da universidade, moradia, limpeza da moradia, alimentação, transporte e as aulas preparatórias para o Revalida.
Outro diferencial dessa universidade é que, após negociações entre a Faag e a Upra, a instituição também aceitará a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como processo seletivo.
Em comparação com o preço das mensalidade para o curso de Medicina de uma instituição de ensino privada na cidade de São Paulo (SP), o valor é praticamente o mesmo, sendo que na Angola esse valor contempla ainda os custos de viver em outro país. Algo que pode ser colocado na balança na hora de escolher onde realizar os seus sonhos.
Conquistar a América ou Continente Velho é possível?
Outra opção para aqueles que desejam estudar no exterior é tentar uma vaga nos Estados Unidos ou em algum país da Europa, entretanto, por mais tentadora que seja a ideia, ingressar em um curso de Medicina nesses países pode ser um processo difícil e longo.
Nos Estados Unidos, o curso de Medicina é considerado uma “pós-graduação”, ou seja, é preciso realizar uma outra graduação preparatória para depois tentar uma vaga nas disputadas Escolas de Medicina.
Aliás, ter uma graduação é apenas um dos pré-requisitos, para ser aceito na pós é preciso também se destacar durante o primeiro curso e ser considerado um dos melhores da turma, além de arcar com os custos exorbitantes. “Por isso, não digo que é impossível um aluno brasileiro fazer Medicina nos Estados Unidos – mas é inviável”, disse Georgia Gabriela, estudante da Universidade de Stanford, para o site Estudar Fora em 2016.
Já na Europa, o processo seletivo pode ser diferente em cada instituição de ensino. Em Portugal, por exemplo, após uma parceria com o Ministério da Educação (MEC), é possível ingressar em diversas universidades utilizando a nota do Enem.
Em entrevista para o site Terra em 2013, Allana Rodrigues, naquela época estudante do quinto semestre de Medicina na Universidade de Düsseldorf, na Alemanha, contou que o processo de ingresso era bastante desgastante.
Para ter a chance de concorrer a uma vaga, os alunos estrangeiros precisavam realizar uma preparação na faculdade e, só após ser aprovado neste “curso” e no exame de proficiência, que o estudante poderia realizar uma espécie de vestibular que, combinado às suas notas no país de origem, determinaria a aprovação ou não.
Ficou curioso para conhecer esses cursos de Medicina em comparação com o Brasil? Veja a grade curricular de quatro diferentes universidades localizadas na Argentina, Angola, Paraguai e também no Brasil.
Essa reportagem faz parte de uma série da Revista Quero sobre Medicina no exterior. Quer saber mais sobre assunto? É só clicar aqui:
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