No futebol, mulheres cursam mais ensino superior do que homens
Levantamento da Revista Quero mostra que a porcentagem de jogadoras que chegaram à faculdade é três vezes maior do que a de jogadores
Quase 7% das jogadoras de futebol contratadas recentemente por clubes brasileiros estão cursando ou já completaram o ensino superior. O percentual é três vezes maior do que o dos jogadores, que só chega a 1,8%. O levantamento foi feito pela Revista Quero com base nos dados de dezembro de 2018 a abril de 2019 do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho.
Nesse intervalo, 158 atletas de futebol feminino com 18 anos ou mais tiveram contratos assinados. Desse total, 11 declararam* ter cursado uma faculdade. A maioria das jogadoras, 72,15%, concluíram o ensino médio.
Minas Gerais está no topo da lista de estados com o maior número de contratações, 45 ao todo, e foi o que registrou mais mulheres no ensino superior: são seis, sendo que quatro declararam ensino superior incompleto e 2 que são formadas.
Em seguida aparece o Rio Grande do Sul, com 35 contratos e 2 jogadoras que chegaram à universidade. Veja abaixo a tabela completa de contratações por estado:
Fundamental Incompl. | Fundamental Completo | Médio Incompl. | Médio Completo | Superior Incompl. | Superior Completo | Total | |
Minas Gerais | – | 3 | 6 | 30 | 4 | 2 | 45 |
Rio Grande do Sul | – | 3 | 10 | 20 | 1 | 1 | 35 |
São Paulo | 5 | 2 | 1 | 22 | – | 3 | 33 |
Ceará | – | – | 1 | 22 | – | – | 23 |
Bahia | 1 | 1 | – | 13 | – | – | 15 |
Amazonas | – | – | – | 3 | – | – | 3 |
Pernambuco | – | – | – | 2 | – | – | 2 |
Paraná | – | – | – | 1 | – | – | 1 |
Rio Grande do Norte | – | – | – | 1 | – | – | 1 |
Menos que 2% dos jogadores tiveram acesso ao ensino superior
Embora o número de atletas de futebol masculino que movimentaram o mercado da bola entre dezembro de 2018 a abril de 2019 seja bem maior que o feminino, o percentual de jogadores que frequentaram uma faculdade é muito baixo.
No período analisado, 3.742 jogadores foram contratados, mas apenas 1,84% declararam o ensino superior, porcentagem que representa 69 atletas. Desses, 34 possuem ensino superior incompleto e 35 são formados. A maioria dos homens, 82,98%, tem o ensino médio completo.
Tanto o percentual de atletas femininas quanto o de masculinos que concluíram o ensino médio é maior que a média brasileira. Conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad C) 2017, aproximadamente 46% dos brasileiros com 25 anos ou mais finalizaram o ensino médio.
Ensino superior como Plano B
No segundo jogo do Brasil na Copa do Mundo de Futebol Feminino 2019, contra a Austrália, ao marcar seu primeiro gol na competição, a jogadora Marta comemorou apontando para a sua chuteira. O calçado preto não mostrava a marca de algum patrocinador esportivo, mas um símbolo que representa a igualdade de gênero.
Em todo o mundo, o futebol feminino é marcado por diversos entraves, como falta de oportunidades, preconceito e salário inferior ao masculino. Esses obstáculos são uma das justificativas para as jogadoras procurarem mais o ensino superior, encarado como uma alternativa de carreira.
Essa é a visão da meio-campista Luana, do Taubaté Futebol Feminino, e estudante do terceiro ano de Educação Física. “Meu sonho sempre foi ser jogadora de futebol, porém quando surgiu a oportunidade de fazer faculdade, eu agarrei. Apesar de ser algo que eu sempre quis, também encaro como um plano B para o futuro”, disse.
Das 25 jogadoras do time, sete estão no ensino superior, cursando Educação Física. O técnico do Taubaté Futebol Feminino, Arismar Júnior, afirma que sempre incentiva as suas jogadoras a estudar e que os convênios com as instituições de ensino ajudam muito.
“No nosso caso, o grande responsável pelo alto número de atletas já no ensino superior é a parceria com as universidades. Assim elas conseguem se preparar para o futuro e têm a opção de trabalhar como educadora física depois, no fim da carreira.”
Ele ainda conta que só não tem mais jogadoras do time na faculdade porque muitas não têm escolaridade para isso, pois estão terminando o ensino médio, e outras têm planos diferentes e não conseguem focar totalmente nos estudos no momento.
Outra jogadora bastante conhecida que recentemente declarou que está investindo na sua formação para garantir o amanhã, depois de se aposentar, é a goleira da Seleção Brasileira de Futebol Feminino, Bárbara. A futebolista projeta iniciar um novo desafio profissional na área da enfermagem.
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Visão além de campo
O ensino superior não precisa ser visto somente como um caminho para o futuro. Ele pode ser um diferencial na hora de jogar bola.
“Cursar Educação Física contribui no treinamento. Quando estou fazendo exercícios, já penso como agem no meu corpo”, comenta Luana.
Para Arismar, a faculdade é muito importante, inclusive como investimento pessoal:
“As minhas atletas que estudam conseguem ter uma leitura, uma interpretação de treinamento, de plano de carreira e de planejamento melhor. Quanto mais o ser humano estiver melhor, o atleta também estará”.
E os treinadores?
De acordo com os dados do Caged, há uma grande diferença na formação dos técnicos em relação aos jogadores. Nos últimos cinco meses, 38 treinadoras profissionais de futebol assinaram novos contratos, sendo que mais de 70% tiveram acesso ao ensino superior.
No caso dos treinadores, a porcentagem também é alta: dos 538 contratados, quase 54% chegou a uma faculdade. E a grande maioria concluiu o curso: 257 profissionais possuem diploma de ensino superior.
Elaboração dos dados: Marcela Coelho/Rodrigo Simões.
Foto de capa: Reprodução/Instagram
*Os dados de escolaridade são autodeclarados, podendo haver alguma divergência com a realidade.
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